GENTRIFICAÇÃO NA ILHA GRANDE

“Esse povo todo chegando e eu doida pra sair deste inferno!!!”

O inferno no caso era o paraíso…

Tinha acabado de chegar na Ilha Grande. A Ilha é maravilhosa, um destino internacional na Costa Verde do Rio de Janeiro. O local possui uma certa infraestrutura atualmente. Lojinhas, restaurantes, bares, agências de turismo/passeios e mercearias. E foi num desses minimercados que a funcionária do caixa, uma jovem de vinte anos, mais ou menos, não parava de praguejar enquanto a massa de turistas passava pela rua.

Eu querendo ir pro continente e não para de chegar gente aqui!

Fiquei meio sem entender, afinal, quem não queria viver e trabalhar num lugar paradisíaco, ter o privilégio da natureza como algo rotineiro enquanto muitos têm essa oportunidade somente algumas vezes na vida? Ir trabalhar sem estresse de segurança, transporte, deslocamentos e tendo o mar e a floresta preservada como paisagem?

Três dias foram suficientes para entender que as oportunidades para os locais, em especial, os da geração Y e Z, podem ser bem restritas.

Após o fechamento do presídio, o turismo se intensificou, gerando mudanças no perfil e fluxo de turistas, impactando a infraestrutura e desenvolvimento local. Ouvi isso diretamente de um pescador. Minhas observações e seu relato me ajudaram a entender um pouco da revolta da moça:

1.Gentrificação:

por ser um local turístico e de alto custo logístico, os preços são mais caros, inclusive dos produtos básicos, o que é praticado para a população local. O custo de vida para o morador é elevado.

2.Poucas fontes de renda:

O pequeno turismo movimenta a economia. Existem lojinhas sortidas no centro, aquele combo de lembranças, artesanato, necessidades tecnológicas, pousadas, aluguel de casas/quartos, restaurantes, pousadas e campings, passeios náuticos e pescaria.

3.Mobilidade:

A Ilha Grande, como o nome diz, é uma ilha. A chegada (15h) e a saída (9h) se dão através da barca, que é gratuita para o morador, uma vez por dia. Existem barcos particulares, mas o custo para uma rotina de uso inviabiliza.

Dá para entender a ira daquela padawan. O jovem local, de família pobre, possui custos maiores em seu dia a dia e também para investir em si, além de ter menor possibilidade e diversidade de renda e contatos do que seu par que está no continente. Para quem já viveu, experimentou e se aventurou pela vida e agora quer sossegar a bunda num lugar estonteante, fica fácil não entender o “estresse infundado” da funcionária.

Agora imagine uma jovem cheia de sonhos em descobrir e explorar esse mundão de meu Deus, ainda mais em tempos de internet com as maravilhas idealizadas na palma da mão (a moça queria conhecer a Lapa-RJ), que nada ali mais a apetece, não podendo nem mesmo pegar a barca e ir ali porque tem horário fixo e outra de volta só no dia seguinte…

Acontece que, às vezes, o paraíso no rabo dos outros é refresco.

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