HELLFUSION é o último capítulo do livro MONKEY S/A: Num Mundo Corporativo Tão Tão Distante…
Nele, acompanhamos as desventuras de Miguelin, um pequeno e insignificante demônio do Quinto Círculo Infernal, numa busca por um lugar ao sol na nova cosmologia baseada numa fusão entre o Céu e o Inferno, criada pelo Alfa e o Ômega, agora conhecido como GEO, God Executive Officer.
Abaixo, a primeira e introdutória página do livro sobre esta nova realidade:
“As divindades perecem quando os homens deixam de acreditar nelas. Desaparecem quando não há energia criadora suficiente, originária da crença humana, para sustentá-las.
Esse foi o destino fatal de muitos deuses e deusas ao longo do Cosmo. A evolução da vida moderna, com suas descobertas científicas e revoluções tecnológicas, acelerou e ampliou ainda mais esse processo letal das deidades.
Então, ciente do risco corrido e respaldado por sua própria onisciência, o Firmamento decidiu, em algum ponto temporal entre as infinitas abóbadas, gerenciar a fé humana de forma a obter um maior e melhor aproveitamento de sua canalização. Para evitar a dissipação da crença entre os dois polos que compõem sua cosmologia, fez-se, então, por sua vontade, um processo de fusão entre o Céu e o Inferno, evitando, assim, o desperdício e promovendo a maximização do uso de tão precioso recurso.
Como isso se deu é algo que está além da nossa compreensão, um mistério como tantos outros de seu currículo. O fato é que, ao invés de se digladiarem pelas almas humanas através dos mais vastos campos de batalha existentes e propícios à tentação ou à salvação, agora, ainda que baseado no livre-arbítrio, novas regras e mecânicas colocariam anjos e demônios trabalhando juntos, considerando até onde isto seria possível dentro de suas naturezas tão distintas.
E as empresas, arranjo tecnológico humano crucial nesse desenrolar, são a trincheira em que os esforços das legiões unificadas estão centrados há alguns séculos, e para onde Miguelin, um pequeno grão de danação, sonha em galgar uma existência melhor nessa nova engrenagem metafísica.
Miguelin era um demônio menor, tanto em hierarquia como em tamanho. Sua pele, de um vermelho vibrante e sem pelos, pouco característica dos de sua classe, contrastava com suas tímidas asas de morcego e olhos de ampulheta. Malicioso como os seus pares, talvez até um pouco mais, era questionador tal qual um arcanjo recém-caído.
Não raro, se pegava divagando com outras paisagens e vivências diferentes daquele pedaço do submundo, contrariando os diversos letreiros da região que diziam para aqueles que lá estivessem que abandonassem todas as suas esperanças. Ainda assim, imaginava alcançar um dia as estrelas, a imensidão do infinito, muito além e distante da eterna vassalagem abissal em que arrastava sua existência.
Mesmo sendo os sonhos algo inalcançável aos de sua espécie, excetuando-se os pesadelos”